Agile Trends: Métricas e Eficiência na Entrega Ágil

Se tem um tema que sempre me faz sair com a cabeça fervendo de ideias, esse tema é métricas. Meu alvo pessoal desse ano como meta de modelo de maturidade. Não aquelas métricas de vaidade, bonitinhas no slide do gestor, mas métricas que realmente ajudam a prever, a melhorar, a trazer impacto real nas entregas.

No Agile Trends, participei de três apresentações que me fizeram repensar como temos medido (ou deixado de medir) nosso trabalho. Cada uma trouxe um olhar prático, crítico e, principalmente, aplicável para o dia a dia de quem vive essa tal de agilidade além do painel de Kanban com post-it na parede.

Teve palestra que mostrou as armadilhas de medir apenas velocidade, outra que defendeu a confiabilidade dos dados antes de qualquer indicador.

Mas afinal, pra que medir?

Sempre ouvi aquela frase clássica: “quem não mede não gerencia”. Confesso que no início da minha carreira eu achava isso papo de gestor querendo planilha bonita pra apresentar em reunião.

Mas, com o tempo, percebi que medir não tem nada a ver com controle pelo controle, ou com microgerenciamento. Medir é, antes de tudo, criar clareza.

Se você não mede, como sabe se está indo para o lugar certo? Como sabe se está melhorando ou só girando a roda sem sair do lugar? Medir é o que nos permite sair do “achismo” e entrar no mundo real, onde as decisões são baseadas em fatos.

Medir é o que te dá a chance de melhorar de forma consciente. Sem métricas, você pode até estar melhorando, mas não faz ideia de onde começou nem para onde está indo.

Meça duas vezes. Corte uma vez só

Harisson Ford

Métricas que impulsionam as entregas em escala nos “Trens do SAFe”

Uma das palestras que mais me chamou atenção foi a do Neubio Ferreira, da Compass UOL, sobre métricas nos Trens do SAFe.

Antes de mais nada, vamos ao básico: o que são esses tais Trens?

No SAFe, um Agile Release Train (ART) é como se fosse um trem mesmo: vários times ágeis viajando juntos, sincronizados, para entregar valor em escala. Imagine 10, 12 times trabalhando no mesmo produto. Sem coordenação, isso vira um caos. E é aí que entram as métricas.

Neubio apresentou as Flow Metrics, que talvez você já tenha ouvido falar, mas provavelmente (assim como eu) nunca tinha visto aplicadas de forma tão pragmática:

Flow Distribution – Mostra como o trabalho está distribuído entre inovação, manutenção, débitos técnicos, etc. Quer saber por que sua empresa nunca resolve problemas estruturais? Dá uma olhada nessa métrica. Se 100% do fluxo é só novas features, prepare o bolso para pagar juros do débito técnico lá na frente.

Flow Velocity – Mede quantas unidades de trabalho você entrega por período. Mas aqui vem o alerta do Neubio: não adianta correr sem direção. Focar só em aumentar velocity pode fazer o time entregar mais… de coisas que ninguém precisa.

Flow Time – Tempo que leva do início ao fim de uma demanda. Essa sim ajuda a criar previsibilidade de verdade. Mas só se você lembrar de diferenciar tempo ativo de tempo parado esperando aprovação ou liberação.

Flow Load – Mede quantos itens estão em andamento ao mesmo tempo. Aqui é onde as empresas caem na armadilha do “quanto mais coisa no WIP, mais rápido entrego”. Spoiler: não entrega. Só gera gargalo.

Flow Efficiency – Mostra qual a porcentagem do tempo que o item está realmente sendo trabalhado versus parado esperando. Quer reduzir lead time? Aumenta a eficiência antes de sair contratando mais gente.

A abordagem que Neubio Ferreira escolheu para a palestra foi bastante interessante. Ele deixa claro que cada métrica tem seus pontos fortes e suas fraquezas.

O que mais gostei foi a frase que ele usou para fechar:

“Métricas são ferramentas estratégicas, não objetivos.”

Ou seja, medir por medir não serve pra nada. Métricas boas são aquelas que guiam a equipe para melhorar de verdade, sem cair na tentação de usar os números como tapa-buraco pra problemas de gestão.

Saiba mais

SAFe Agile Metrics: Measure Your SAFe Success – Planview

Link da apresentação na íntegra


Métricas Ágeis na Prática: estruturando indicadores para Squads com Scrum e Kanban

Outra palestra que me prendeu na cadeira foi a do Thiago Pio, da Brisanet. O título já era promissor, mas o conteúdo foi melhor ainda porque saiu do mundo das ideias e mostrou como aplicar métricas na vida real, com squads de Scrum e Kanban.

Logo de cara, ele trouxe uma realidade que muitos vivem (e fingem não ver):

👉 Gestão no feeling.

Sabe aquela gestão baseada em frases como “acho que estamos indo bem” ou “parece que o time está mais produtivo”? Pois é. Foi exatamente esse cenário que ele encontrou: silos entre áreas, processos sem padrão e uma cultura ágil bem frágil.

E como ele começou a mudança? Não foi comprando ferramenta cara nem enchendo os times de dashboards mirabolantes. Ele reforçou a cultura.

Isso mesmo. Antes de medir qualquer coisa, ensinou os fundamentos da agilidade de verdade para os times. Fez o famoso “primeiro o porquê, depois o como”. Só depois disso estruturou o uso de métricas para dar clareza e não apenas cobrar performance.

Entre as métricas que eles aplicaram na prática, ele citou:

  • Lead Time & Customer Lead Time – Medindo não só quanto tempo o time leva para entregar, mas o tempo total desde que a demanda nasce até chegar no cliente. Porque não adianta nada ter um time ágil se o backlog fica parado meses esperando priorização.
  • Cycle Time Upstream e Downstream – Separando o tempo de preparo (descoberta, análise, design) do tempo de desenvolvimento e entrega. Isso ajuda a identificar onde está o real gargalo do fluxo.
  • Taxa de Bugs e Taxa de Hotfix – Para monitorar qualidade técnica e evitar a famosa “entrega rápida que quebra em produção”.
  • Throughput & Velocity – Sim, medir quantidade de entrega ainda importa, mas sempre conectado ao valor gerado.
  • Taxa de Compromisso e Burndown – Para squads Scrum, ajudou a avaliar previsibilidade e a maturidade no planejamento das sprints.

Uma parte que gostei muito foi como eles integraram o Jira com o Looker Studio, criando dashboards simples, filtráveis e abertos para todo mundo. Sem esconder métrica atrás de Power BI com permissão restrita só pra gestão.

Particularmente essa palestra me pegou bastante porque na BNP vivemos um cenário semelhante, algumas ferramentas diferentes, Asana, Azure DevOps, Trello, Miro, Milvus e ainda cogitamos outras porém a Vanessa Genaro me puxando pra cima sempre alertando.

Não importa a ferramenta, o que importa é a cultura! Quando as pessoas sabem a importância, a ferramenta vira algo secundário.

Thiago finalizou reforçando algo que também carrego comigo:

Transparência é a base. Métrica sem cultura forte vira arma de cobrança.

E é verdade. Se a equipe não confia que a métrica é pra ajudar, qualquer indicador vira medo. E medo paralisa.

Saiba mais

Link da apresentação na íntegra


Além dos Dados: uma abordagem sobre a confiabilidade das métricas

Pra fechar o tema métricas com chave de ouro, assisti a palestra do Thiago Moriyuki Higa, do Grupo Boticário. E aqui o papo ficou sério.

Sabe quando você acha que está medindo tudo certo, mas mesmo assim as decisões continuam ruins? Então. Ele começou exatamente com esse ponto: métricas por si só não respondem às perguntas certas.

Ele contou que, quando chegou no Grupo Boticário, já existia um time ágil implementando ferramentas com dashboards cheios de métricas de fluxo. Parecia o paraíso dos dados… mas tinha um detalhe: os dados não eram confiáveis.

E sem confiabilidade, as métricas viram aquele famoso “para inglês ver”. Gráficos bonitos para apresentação, mas que não ajudam em absolutamente nada o dia a dia do time.

Thiago dividiu os principais problemas que encontrou:

  • Baixa padronização entre equipes, cada uma medindo de um jeito;
  • Falta de clareza nos fluxos de trabalho, nos tipos de item e nas definições mínimas (DoR, DoD, ponto de comprometimento);
  • Dados fragmentados e pouco confiáveis para gerar insights reais;
  • Falta de guardrails claros – aquelas regras mínimas para garantir consistência, sem tirar a autonomia do time.

Ele trouxe uma frase que anotei com destaque no meu caderno:

“Podemos ter sotaques diferentes, mas precisamos falar a mesma língua.”

Ou seja, cada time pode ter sua forma de trabalhar, mas se quiserem analisar dados juntos para decisões estratégicas, precisam ter um mínimo de padrão. Caso contrário, cada métrica conta uma história diferente e ninguém sabe qual é a real.

Thiago estruturou as ações de confiabilidade em três níveis:

Operacional

Garantir que todos os times saibam o básico: tipos de cards, colunas do Kanban, definição clara de bloqueios, DoR, DoD.

Tático

Conectar esses padrões aos objetivos de negócio, criando governança entre squads, épicos, iniciativas e OKRs.

Estratégico

Usar essas métricas padronizadas para tomadas de decisão que impactam o negócio como um todo.

No fim, ficou claro que medir sem confiabilidade é pior do que não medir. Porque gera decisões baseadas em ilusões.

Medir é só o começo

Essas três palestras me lembraram de algo que muitas vezes esquecemos: métricas não servem para dizer se você está bem ou mal, mas para te mostrar a verdade.

A verdade do fluxo que não flui.
A verdade do débito técnico escondido debaixo do tapete.
A verdade das decisões baseadas em feeling disfarçado de experiência.

E se tem algo que aprendi nesse Agile Trends é que “quem não mede não gerencia”, mas quem mede errado gerencia pior ainda.

Por isso, antes de sair aplicando qualquer métrica bonita que você viu num slide, pergunte:

✅ Para que estou medindo isso?
✅ Essa métrica ajuda meu time ou só alimenta o ego do gestor?
✅ Os dados são confiáveis ou só bonitos?

E esse foi só o começo do que vi no Agile Trends. Nos próximos posts, vou compartilhar outras palestras que me fizeram refletir sobre design de produto, liderança, IA e até semana de 4 dias de trabalho. Mas esse papo fica para depois.

Por enquanto, deixo a pergunta:

👉 Quais métricas fazem sentido para o seu time hoje?

Porque medir por medir, meu amigo… é só mais um desperdício disfarçado de produtividade.

Sobre Filipe Borges 13 Artigos
Coordenador do time de desenvolvimento na BNP Soluções em TI. Ex-treinador de overwatch. Viciado em resolução de problemas. Sommelier de café não-oficial e pai do Heitor

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